Otimismo do mercado foi motivado pelo IPCA de março abaixo das expectativas e com os investidores avaliando sinalizações do governo sobre aprimorar o novo arcabouço fiscal

O dólar comercial fechou ontem em forte queda, tendo ficado inclusive brevemente abaixo de R$ 5, enquanto o Ibovespa saltou mais de 4%. O otimismo do mercado foi motivado pelo IPCA de março abaixo das expectativas e com os investidores avaliando sinalizações do governo sobre aprimorar a proposta do novo arcabouço fiscal.

Pesou ainda a perspectiva de um cenário externo mais favorável, devido à expectativa de que os EUA encerrem o ciclo de alta de juros. Mas analistas têm dúvidas sobre quão sustentável é esse cenário.

O Ibovespa, principal índice da Bolsa, a B3, fechou ontem com alta de 4,29%, aos 106.214 pontos. Foi o melhor pregão desde 3 de outubro, quando houve alta de 5,54%. Já o dólar caiu 1,17%, a R$ 5,0067 — a menor cotação de fechamento desde 10 de junho, quando encerrou a R$ 4,9871. Na mínima do dia, a moeda americana foi negociada a R$ 4,9894.

No ano, o dólar cai 5,14% em relação ao real. A valorização da moeda brasileira é efeito de vários fatores, como o fluxo cambial positivo, os juros altos aqui e o desempenho mais fraco do dólar no exterior. No primeiro trimestre, o fluxo cambial ficou positivo em US$ 12,524 bilhões, impulsionado pelo superávit de US$ 16,1 bilhões da balança comercial.

— No contexto global, com as altas de juros nos EUA chegando ao fim e o diferencial de juros (a diferença entre a taxa nos EUA e no Brasil) favorável, pode ser sustentável (ter um dólar abaixo de R$ 5). Acho que precisamos ver o arcabouço finalizado e aprovado para solidificar e eventualmente até buscar patamares mais valorizados — afirma o sócio e gestor da Galapagos Capital, Sérgio Zanini.

Os EUA divulgam hoje o índice de preços ao consumidor (CPI, na sigla em inglês) de março, e analistas ouvidos pela Bloomberg projetam que será de 5,2%, contra 6% no mês anterior. O Fundo Monetário Internacional, porém, alertou ontem para a inflação global .

‘Um primeiro sinal’

Com relação à inflação brasileira, o que animou os investidores, diz o economista-chefe da Oriz, Marcos De Marchi, foi que, além do número abaixo das projeções, os núcleos também cederam, o que indica uma melhora qualitativa:

— Foi um primeiro sinal. É evidente que só um dado não é suficiente para o Banco Central começar a cortar juros, mas o mercado se adianta nessas horas. Ele tenta precificar o que esse primeiro sinal pode significar em termos de tendência.

Segundo De Marchi, se o IPCA-15 de abril confirmar a tendência de recuo da inflação, o mercado começará a projetar um corte da Selic, atualmente em 13,75%, no início do segundo semestre. Já o economista-chefe da Órama, Alexandre Espirito Santo, diz que já se especula que a redução comece em junho:

— Em 12 meses, já estamos com a inflação acumulada abaixo de 5%.

Ainda no cenário interno, os investidores refletiram declarações do secretário do Tesouro Nacional, Rogério Ceron, de que o novo arcabouço fiscal do terá mecanismos para evitar mudanças nas metas para o desempenho das contas públicas estabelecidas pelo governo ao longo dos anos.

A regra estabelece que, no início de um governo, cada presidente deve indicar quais metas pretende perseguir para as contas públicas num horizonte de quatro anos (um mandato). Especialistas vinham questionando a possibilidade de mudanças repentinas nas metas, o que geraria descrédito com a regra fiscal.

— Tem amarras (para evitar mudança na meta). Tem a possibilidade de atualizar por mudanças de contexto econômico, porque é um marco para ser sustentável no tempo. Mas com condicionantes — afirmou Ceron.

O texto deve ser apresentado formalmente ao Congresso esta semana.

Segundo De Marchi, se não houver nenhuma surpresa negativa sobre o arcabouço fiscal, “há espaço para a moeda brasileira se valorizar.”

Juros futuros recuam

Já o economista-chefe da Warren Rena, Felipe Salto, ex-secretário de Fazenda de São Paulo, avalia que a proposta de limitar gastos extras com investimentos contribuiria para a redução da dívida:

— Não é porque a despesa ganha a classificação de investimento que ela é necessariamente positiva. Há muito investimento ruim. É preciso ser seletivo, e uma forma de fazê-lo é por meio desse tipo de limitação. Uma boa ideia, neste caso.

Mas ele vê com preocupação a ideia de expurgar da conta as chamadas receitas extraordinárias, pois entende que não há uma metodologia consolidada para a Fazenda fazer esse cálculo:

— Seria preciso adotar uma metodologia e, mais importante, ter um escrutínio minucioso de órgão de fora do Executivo, para que não se fique modificando o cálculo ao sabor da conjuntura.

O otimismo se refletiu nos juros futuros. A taxa do contrato de Depósito Interfinanceiro (DI) para janeiro de 2024 caiu de 13,225% para 13,15%, e a do DI para janeiro de 2025 cedeu de 11,99% para 11,805%.

No Ibovespa, aéreas e varejistas estiveram entre as maiores altas. Gol PN subiu 17,13%, e Azul PN, 13,81%. Magazine Luiza ON avançou 12,84%, e Via ON, 7,45%.


Fonte: O GLOBO