Jovens desacompanhados são em sua maioria adolescentes albaneses; ativistas e parlamentares acreditam que foram sequestrados por gangues criminosas

Porto Velho, RO - Cerca de 200 menores desacompanhados — a maioria adolescentes albaneses — estão desaparecidos dos hotéis em que estavam alojados pelo governo britânico seus enquanto aguardavam decisões sobre seus pedidos de asilo. O sumiço gerou indignação entre defensores dos direitos humanos, que pedem medidas protetivas mais eficientes e exigem que parlamentares resolvam o problema.

Os jovens desaparecidos estão entre as dezenas de milhares de pessoas que chegaram ao Reino Unido em pequenos barcos depois de cruzar o Canal da Mancha nos últimos anos. A maioria dos adolescentes requerentes de asilo está alojada em hotéis enquanto aguardam seu destino pelo Ministério do Interior, que diz que eles são livres para ir e vir quando quiserem, apesar da idade.

Autoridades dizem acreditar que muitos dos desaparecidos foram sequestrados por gangues criminosas e explorados, levantando grandes questões sobre as falhas do governo. 

Londres não respondeu imediatamente a um pedido de comentário, mas confirmou que pelo menos 200 crianças em busca de asilo desapareceram de hotéis. Os parlamentares da oposição questionaram todo o programa de alojamento de menores.

Uma investigação publicada esta semana pelo jornal The Observer sobre um hotel na área de Sussex, no Sul da Inglaterra, revelou que das aproximadamente 600 crianças desacompanhadas com menos de 18 anos que passaram por suas portas nos últimos 18 meses, 136 foram dadas como desaparecidas e 79 ainda não foram encontradas. 

No ano passado, dados publicados pelo governo mostraram que mais de 222 crianças desacompanhadas em busca de asilo estavam desaparecidas de hotéis administrados pelo Ministério do Interior em todo o Reino Unido.

Política de inação

O governo respondeu às críticas generalizadas em uma série de declarações esta semana. Robert Jenrick, ministro da Imigração, disse que das 4.600 crianças em busca de asilo que chegaram ao Reino Unido desde 2021, cerca de 440 desapareceram e apenas metade foi encontrada. A polícia local tem a tarefa de procurar os desaparecidos, mas só conseguiu localizar alguns.

Das 200 crianças que continuam desaparecidas, a maioria são adolescentes mais velhos, mas 13 têm menos de 16 anos e uma é do sexo feminino. A maioria, 88%, são cidadãos albaneses.

No ano passado, das cerca de 40 mil pessoas que fizeram a perigosa travessia do canal, cerca de 13 mil eram albanesas, e o governo do primeiro-ministro Rishi Sunak prometeu reprimir essas chegadas e rejeitar seus pedidos de asilo.

Falando no Parlamento na terça-feira, Jenrick disse que, embora os relatórios fossem preocupantes, ele não viu nenhuma evidência de que crianças estivessem sendo sequestradas nos hotéis.

— Não temos poder para deter crianças desacompanhadas em busca de asilo nesses locais e sabemos que algumas desaparecem — afirmou, reconhecendo que os solicitantes de asilo estavam livres para deixar os hotéis.

Peter Kyle, um parlamentar trabalhista de oposição para Hove, a área onde o hotel detalhado no relatório do Observer estava localizado, criticou a inação do governo na terça-feira no Parlamento.

— A verdade desconfortável para nós é que se uma criança que fosse parente de um de nós nesta sala desaparecesse, o mundo pararia. Mas na comunidade que represento, uma criança desapareceu, depois cinco desapareceram, depois uma dúzia desapareceu, depois 50 desapareceram — comentou, acrescentando que mais de 70 estão desaparecidas “e nada está acontecendo”.

Yvette Cooper, que chefia a política de imigração do Partido Trabalhista, falando no programa “BBC Breakfast” na manhã desta quinta-feira, disse que os relatos de requerentes de asilo desaparecidos mostraram que o governo conservador falhou em tomar medidas sérias para resolver o problema.

— Há um padrão aqui, mas ninguém está investigando adequadamente — disse ela. — Não há nenhuma unidade de acolhimento indo atrás deles e dizendo: 'isso é um padrão', onde os jovens estão sendo traficados pelo canal e depois para fazendas de maconha, ou para a prostituição em alguns dos piores casos, não obstante em crimes organizados, sendo pegos fora desses hotéis.

Terceirização do problema

Hotéis têm sido usados para abrigar requerentes de asilo no Reino Unido há anos em meio à escassez de outras acomodações temporárias. 

Em julho de 2021, menores desacompanhados que chegavam ao território britânico também começaram a ser alojados em hotéis. O Ministério do Interior é responsável por esse acolhimento, mas faz parceria com empresas privadas para fornecer a acomodação e também terceiriza a gestão do programa.

Como o tempo que as pessoas esperam para que seus pedidos de asilo sejam decididos aumentou constantemente nos últimos anos, o número de pessoas que permanecem nesses hotéis também aumentou, e grupos de direitos humanos há muito criticam as condições dentro dessas instalações.

Eles alertaram especificamente que a política de abrigar crianças desacompanhadas em hotéis falhou em proteger alguns dos requerentes de asilo mais vulneráveis e disseram que exigiram mudanças na forma como o governo processa os pedidos de asilo.

Mais de 100 instituições de caridade pediram ao governo em uma carta aberta que tomasse medidas sobre os menores desaparecidos, exigindo que o Ministério do Interior parasse de abrigar crianças em “hotéis inseguros, onde podem ser alvo de criminosos”.

Enver Solomon, chefe do Conselho de Refugiados, uma das organizações por trás da carta, disse em um comunicado que o governo tem “um dever legal muito claro” de proteger essas crianças, mas que “está falhando em fazê-lo com dezenas aparentemente desaparecendo nas garras daqueles que irão explorá-las e abusar delas”.

— Sabemos pelo nosso trabalho que as crianças que experimentaram horror inimaginável e revolta chegando ao nosso país em busca de segurança estão altamente traumatizadas e vulneráveis — disse ele, acrescentando: — Este é um escândalo de proteção à criança que os conselhos, a polícia e os ministros devem abordar com urgência para garantir que cada criança desacompanhada seja importante e mantida em segurança.


Fonte: O GLOBO