Segundo missão, regime de Maduro aplica choques elétricos e asfixia com sacolas de plástico, entre outros métodos

Manifestante contrário ao governo da Venezuela durante protesto do lado de fora do Parlamento espanhol — Foto: Pierre-Philippe MARCOU / AFP

Porto Velho, Rondônia - Socos, choques elétricos, inclusive nos genitais, asfixia com sacos de plástico, imersão em água fria e privação do sono durante 24 horas. Esses são alguns dos métodos de tortura usados pela ditadura de Nicolás Maduro, de acordo com o último relatório apresentado pela Missão Internacional Independente de Determinação dos Fatos sobre a República Bolivariana da Venezuela, criada pelas Nações Unidas.

O documento foi apresentado na terça-feira em Genebra. Segundo uma das relatoras, Patricia Tappatá Valdez, nesta nova investigação realizada pela missão não foram identificados novos patrões de violação dos direitos humanos, mas, sim, “a intensificação da repressão, que ocorre, simultaneamente, de forma generalizada e seletiva”.

— Tudo o que aconteceu após 28 de julho [data da eleição presidencial] teve o objetivo de intimidar a população — diz Valdez ao GLOBO.

De acordo com a relatora da missão, “um dos pontos mais importantes do novo relatório é a conclusão de que existe um ataque generalizado e sistemático contra a população civil”. O documento afirma que “a missão tem motivos razoáveis para acreditar que algumas das violações dos direitos humanos investigados durante esse período representam uma continuidade da mesma linha de conduta que a missão caracterizou em relatórios anteriores como crimes contra a Humanidade”.

Menores de idade

E continua: “Essas violações não foram o resultado de eventos isolados ou aleatórios, mas fazem parte de uma série de eventos cometidos na implementação de um plano coordenado para silenciar, desencorajar e sufocar a oposição ao governo do presidente Maduro.”

A tortura faz parte desse plano, e sua aplicação tem sido denunciada por mães de menores de idade, presos após a divulgação, por parte do Conselho Nacional Eleitoral (CNE), do resultado indicando a segunda reeleição de Maduro, reconhecida apenas por governos aliados da ditadura venezuelana, como Turquia, China, Rússia e Irã.

A detenção de adolescentes é uma das novidades desta nova etapa da repressão na Venezuela, destacam advogados que atuam em ONGs de defesa dos direitos no país.

— Recebemos relatos de torturas, mas ainda não foram feitas denúncias. As pessoas têm medo — diz Alfredo Romero, da Foro Penal.

Segundo ele, um dos elementos centrais do atual momento repressivo no país é o isolamento dos presos, “o que torna mais difícil saber o que está acontecendo dentro das prisões”. As primeiras informações que circulam foram divulgadas por mães de jovens que tiveram algum contato com suas famílias ou, em alguns casos, já foram libertados. Uma delas é Theany Urbina, cujo filho, Miguel Urbina, foi detido em 2 de agosto.

— Os rapazes dizem que aplicaram choques elétricos neles — contou Theany, em entrevista a alguns meios de comunicação venezuelanos.

Ela contou , ainda, que “tem uma coisa que chamam de ‘capuz de cebolinha’, que é quando colocam a cabeça de uma pessoa dentro de um saco plástico com gás lacrimogêneo”. Seu filho está atualmente detido numa prisão em Caracas, acusado, como todos os demais jovens presos após 28 de julho, de terrorismo. No caso de Miguel, revelou sua mãe, as torturas foram aplicadas para obrigá-lo a gravar um vídeo admitindo as acusações feitas pelo regime de Maduro contra ele.

As torturas, segundo o relatório da missão da ONU, são aplicadas por agentes da Polícia Nacional Bolivariana (PNB) e pelo Serviço Bolivariano de Inteligência (Sebin). Marino Alvarado, diretor do Programa Venezuelano de Educação-Ação em Direitos Humanos (Provea), assegura que os presos estão sendo torturados em cárceres em vários estados venezuelanos e, também, em delegacias policiais.

— Os primeiros relatos que estamos recebendo confirmam as torturas. A Venezuela está entrando em uma nova etapa em termos de repressão — aponta.

Acusações de terrorismo

O diretor do Provea destaca três elementos novos no esquema de perseguição a opositores ou “qualquer pessoa que seja percebida como crítico”: todos, sem exceção, são acusados de terrorismo; em cerca de 90% dos casos, os presos passam dias desaparecidos; a quantidade de adolescentes presos.

— Além dos detentos, suas famílias também sofrem maus-tratos. Sabemos de homens e mulheres obrigados a ficarem nus e revistados de forma violenta antes das visitas — comenta Alvarado.

O relatório da missão da ONU menciona o caso do jovem John Álvarez, líder estudantil e juvenil do partido político Bandeira vermelha. “Álvarez foi preso em 30 de agosto de 2023 e, no mesmo dia de sua prisão foi transferido para uma delegacia de polícia em Caracas, onde foi submetido a tortura física e sexual. Álvarez recebeu golpes e choques elétricos nos órgãos genitais e em outras partes do corpo para forçá-lo a implicar vários dirigentes sindicais, políticos e jornalistas em atos ilegais. Em consequência das torturas a que foi submetido, Álvarez sofre “consequências físicas”, diz o documento.


Fonte: O GLOBO