Atiradores atacaram sala de concertos minutos antes de show; grupo terrorista Estado Islâmico assumiu ataque

Um grupo de homens armados invadiu um centro comercial em Krasnogorsk, um subúrbio de Moscou, nesta sexta-feira, deixando pelo menos 93 mortos e 145 feridos, de acordo com o Serviço Federal de Segurança da Rússia. 

Um grande incêndio — que já foi contido, segundo o governador da capital — consumiu parte do prédio, e cerca de 100 pessoas foram resgatadas pelo terraço do complexo, através de escadas e helicópteros. 

O grupo terrorista Estado Islâmico assumiu a autoria do ataque, mas integrantes do governo também apontam para a Ucrânia, que nega.

— De acordo com dados preliminares, um grupo de desconhecidos de duas a cinco pessoas em uniformes táticos, armados com armas automáticas, abriu fogo contra os guardas na entrada da sala de concertos [do centro comercial]. Depois começaram a atirar nos espectadores no foyer — afirmaram autoridades locais à agência Interfax.

Os bombeiros foram impedidos inicialmente de atuar no combate às chamas por questões de segurança e precisaram aguardar a chegada das forças especiais da polícia. Segundo testemunhas, eles não conseguiam apagar os focos das chamas por causa das altas temperaturas e da dificuldade de acesso ao interior do prédio, que está "completamente" envolvido pelas chamas. 

O Ministério das Situações de Emergência afirma que 320 pessoas participavam do trabalho, que envolve até helicópteros normalmente usados em incêndios florestais.

Os disparos foram relatados pouco antes do show da band Piknik, que se apresentaria em um teatro localizado no centro comercial. O incêndio foi causado pelos atiradores, que atearam fogo às cadeiras, e as chamas rapidamente se espalharam pela sala de espetáculos e pelo prédio.

— Ouvimos tiros, a princípio não sabíamos o que acontecia. Então vi terroristas atirando nas pessoas. Jogaram vários coquetéis molotov e tudo pegou fogo. Fomos levados para a saída. A porta de saída estava trancada, depois fomos para o porão, onde esperamos por ajuda — disse Vitaly, uma testemunha do ataque, ao serviço russo da BBC.

Além do show, havia uma competição de dança infantil, e testemunhas relataram uma grande confusão quando os primeiros disparos foram ouvidos. Um segurança afirma que os homens começaram a atirar na entrada do centro comercial e depois seguiram para a sala de concertos.

— Havia mais três guardas na entrada, nos escondemos atrás de um outdoor de madeira e os agressores se afastaram 10 metros de nós. Eles começaram a atirar aleatoriamente nas pessoas no andar térreo e depois foram em direção à sala de concertos ou ao aquário — disse o homem à agência Baza.

O incêndio consumia uma área de até três mil metros quadrados, e parte do teto desabou. Cerca de 100 pessoas ficaram presas em uma área bloqueada pelas chamas e eram resgatadas pelo terraço. Foram ouvidas ao menos duas grandes explosões, mas não se sabe se foram provocadas por explosivos ou por equipamentos do centro comercial, como cilindros de gás. Há 115 pessoas internadas, incluindo cinco crianças.

"Quarenta pessoas morreram durante o ataque terrorista em Crocus, mais de 100 ficaram feridas. Minhas mais profundas condolências às famílias das vítimas. Os médicos continuam a prestar assistência a todas as vítimas. Os médicos avaliam a condição da maioria como moderada, cinco estão em estado grave” disse o governador da região de Moscou, Andrei Vorobyov, no Telegram mais, antes do número de mortos ser atualizado para mais de 60 na noite desta sexta (madrugada de sábado no horário local). 

Segundo a Secretaria de Saúde da região de Moscou, 146 pessoas precisaram de algum tipo de atendimento.

Detalhe de incêndio em centro comercial em Krasnogorsk, nos arredores de Moscou — Foto: AFP

Segundo uma testemunha ouvida pela agência Mash, o ataque foi realizado por cinco homens, que "agiram como militantes treinados e preparados", e que teriam matado as pessoas que estavam perto das portas do teatro. Imagens divulgadas em redes sociais mostram vários corpos no chão em um hall de entrada do centro comercial, mas as autoridades não confirmaram sua autenticidade.

— Os terroristas estão armados com rifles de assalto AKM. Alguns tinham muita munição, e dois deles usavam mochilas, possivelmente com coquetéis molotov — disse a testemunha.

Veículo apontado como o usado pelos atiradores do Crocus City Hall — Foto: Reproduçao

Um carro branco, cuja foto foi divulgada em redes sociais, pode ter sido o veículo usado pelos atiradores, inclusive para deixar o local, afirma a imprensa russa. Jornalistas da Novaya Gazeta conseguiram entrar em contato com o proprietário do carro, que disse tê-lo vendido recentemente a um parente de sua mulher. Ele compareceu à delegacia para prestar esclarecimentos, mas as autoridades não afirmam se os atiradores usaram o veículo, ou se algum deles foi preso ou morto.

No Telegram, Vorobyov disse que foi criada uma base operacional próxima ao centro comercial, e todos os eventos públicos na cidade de Moscou, que é uma região administrativa diferente, foram cancelados. Em São Petersburgo, segunda maior cidade da Rússia, um concerto foi interrompido às pressas e as pessoas retiradas, algo que também aconteceu em alguns dos maiores centros comerciais locais. Em outras regiões, medidas semelhantes foram adotadas, incluindo o aumento de segurança nas ruas e o cancelamento de eventos públicos.

Acusações a Kiev

Também no Telegram, a porta-voz da Chancelaria, Maria Zakharova, disse que foi um "sangrento ataque terrorista".

"O Ministério das Relações Exteriores da Rússia está recebendo ligações de todo o mundo, de cidadãos comuns expressando condolências em relação à terrível tragédia na Prefeitura de Crocus e palavras de forte condenação a este sangrento ataque terrorista que ocorre diante dos olhos de toda a Humanidade", escreveu Zakharova. O presidente Vladimir Putin ainda não se pronunciou, mas o secretário de Imprensa do Kremlin, Dmitry Peskov, disse que ele está sendo informado sobre o atentado.

— Nos primeiros minutos do ocorrido no Crocus City Hall, o presidente foi informado. O presidente recebe constantemente informações sobre o que está acontecendo e as medidas que estão sendo tomadas por meio de todos os serviços competentes. O presidente deu todas as instruções necessárias — disse Peskov à RIA.

Incêndio consome o centro comercial Crocus City Hall, nos arredores de Moscou — Foto: AFP

O vice-porta-voz do secretário-geral da ONU, Farhan Haq, disse que "estamos tristes com esta notícia. Estamos tentando obter mais informações sobre o que aconteceu", em comunicado.

Segundo a Casa Branca, o presidente Joe Biden foi informado sobre o atentado. Em entrevista coletiva, o porta-voz do Conselho de Segurança Nacional dos EUA, John Kirby, afirmou que "não há nenhuma indicação neste momento de que a Ucrânia ou os ucranianos estejam envolvidos num ataque armado".

— É óbvio que há pessoas em Moscou e na Rússia que não concordam com a forma como o sr. Putin comanda o país. Mas não creio que possamos estabelecer uma ligação entre o ataque ao centro comercial e o regime político neste momento — disse Kirby.

Mykhailo Podolyak, assessor do chefe do Gabinete do Presidente da Ucrânia, também negou qualquer envolvimento do país, e o serviço de inteligência ucraniano sugeriu que teria sido uma ação orquestrada pelo próprio Putin, para "intimidar os russos" e "justificar ataques mais duros" contra Kiev.

Zakharova imediatamente respondeu, questionando se os americanos têm elementos para "inocentar" alguém.

"Com base em que as autoridades em Washington tiram quaisquer conclusões sobre a inocência de alguém no meio de uma tragédia? Se os Estados Unidos têm ou tiveram informações confiáveis ​​a esse respeito, elas devem ser imediatamente transferidas para o lado russo. E se não existirem tais dados, a Casa Branca não tem o direito de conceder indulgências a ninguém", escreveu Zakharova no Telegram, afirmando que "todos os envolvidos, conforme afirmou a liderança russa, serão identificados pelas autoridades competentes".

O ex-presidente e vice-chefe do Conselho de Segurança, Dmitry Medvedev, prometeu encontrar e destruir" os responsáveis pelo ataque, sugerindo que teriam sido obra da Ucrânia.

Serviços de emergência se reúnem diante do Crocus City Hall, nos arredores de Moscou — Foto: AFP

“Se for estabelecido que estes são terroristas do regime de Kiev, é impossível lidar de forma diferente com eles e com os seus inspiradores ideológicos. Todos eles devem ser encontrados e destruídos impiedosamente como terroristas. Incluindo funcionários do Estado que cometeram tal atrocidade”, disse, no Telegram.

Pouco depois da meia-noite pelo horário de Moscou, 18h pelo horário de Brasília, o grupo terrorista Estado Islâmico anunciou, através de sua agência de notícias, a Amaq, a autoria do ataque contra o centro comercial, sem dar mais detalhes.

No começo do mês, a embaixada dos EUA em Moscou emitiu um alerta para o risco de um "ataque de extremistas" na capital russa, orientando os cidadãos americanos a evitarem grandes aglomerações. O alarme veio no mesmo dia em que autoridades anunciaram a morte de supostos integrantes do grupo terrorista Estado Islâmico em uma região a cerca de 200 km da cidade.

Na ocasião, o FSB informou que os suspeitos mortos integravam uma célula do chamado Estado Islâmico do Khorasan, ou ISIS-K, baseado no Afeganistão e que tem presença nas ex-repúblicas soviéticas da Ásia Central. No começo do mês, seis pessoas suspeitas de integrar a organização foram mortas na Inguchética, na região do Cáucaso.


Fonte: O GLOBO