Empresas terão de compartilhar dados, além de limitar tempo de jogo de casa apostador

O governo prepara um sistema para monitorar, em tempo real, todas as apostas on-line feitas pelas empresas que se registrarem para operar no Brasil. A lei que regulamenta esse tipo de atividade foi sancionada no fim do ano passado. O texto também taxa os ganhos dos apostadores e o faturamento das empresas.

O programa, desenvolvido pelo Serviço Federal de Processamento de Dados, poderá identificar fraudes no pagamento de impostos, e também monitorar os perfis de apostadores e alertá-los para um possível vício. As empresas serão obrigadas por lei a fornecerem os dados dos jogadores.

— É um sistema integrado, que vai mostrar para a gente em tempo real, talvez com alguns minutos de delay, a movimentação das apostas, para que a gente possa não só fiscalizar o recolhimento dos tributos, mas também uma possível fraude, externalidade negativa, ou até mesmo manipulação de resultados — disse ao GLOBO o assessor especial da Fazenda, Francisco Manssur, responsável pelo assunto na pasta.

A Fazenda também quer cruzar dados para saber quantas horas os apostadores passam on-line.

— Queremos casar os dados de todas as empresas, por usuário. Se o José da Silva, por exemplo, está passando mais de 10 horas apostando, podemos assim captar um caso de eventual patologia e endividamento — disse Mansur.

Alerta de fraudes

O sistema também será acessado pelo Ministério do Esporte, que fará o monitoramento de apostas esportivas atípicas, que possam indicar manipulação de resultados de futebol. Se for localizada, por exemplo, uma aposta esportiva de R$ 1 milhão em um escanteio de um time pequeno, isso poderia ligar um sinal amarelo, já que não seria uma aposta comum.

A partir daí, o governo mandaria um aviso ao time, ou entidade esportiva responsável, para análise do comportamento do atleta em campo. O Esporte também ficará encarregado de redistribuir a arrecadação das apostas para as entidades esportivas.

Início das autorizações

O Ministério da Fazenda trabalha para abrir, até o início de fevereiro, o prazo para que as empresas de apostas on-line peçam autorização para funcionar no Brasil, como prevê a lei.

A janela de inscrições deve ser aberta duas vezes ao ano, e ficará aberta por algumas semanas, a companhia que perder o período ou tiver o pedido negado, ficará ilegal no Brasil.

Para ser autorizada a funcionar em território brasileiro, a empresa terá que primeiramente contratar um laboratório credenciado pelo governo para uma análise de adequação e emissão de um certificado de conformidade com as regras estabelecidas em lei. Será como uma espécie de auditoria externa.

Os documentos serão, então, entregues ao governo no prazo estabelecido e a autorização emitida em até 30 dias, após o pagamento da taxa obrigatória de R$ 30 milhões.

— A lei não veio para liberar os jogos, ela veio para proteger as pessoas, os jogos já existiam, sem regra nenhuma. Criamos um marco regulatório. Temos que fazer justiça tributária e arrecadar para que o governo possa investir nas prioridades, saúde, educação, saneamento básico. Temos em mente 12 portarias para soltar ao longo do ano — disse o assessor da Fazenda.

A primeira portaria do governo, que complementa a lei aprovada no Congresso Nacional, vai validar os laboratórios de auditoria; a segunda vai regulamentar a publicidade das plataformas de apostas em redes sociais, rádio e TV; e a terceira estabelecerá os prazos para autorização de funcionamento.

— Estamos olhando com seriedade para a publicidade. Na portaria, vamos falar da responsabilidade da empresa que faz a propaganda e do veículo que estiver exibindo. Não vamos permitir publicidade camuflada, nem mensagem de quem ficou rico do dia para noite — garantiu o assessor da Fazenda.

Mansur disse ainda que o governo vai olhar com atenção os influenciadores digitais que possam vincular informações falsas e jogos não permitidos.

— O ambiente virtual que a criança e o adolescente frequentam hoje, não tem hora definida, não temos mais programação infantil na TV. Precisamos olhar se a mensagem passada não está sendo direcionada para criança — afirmou.

Francisco Mansur ainda garantiu que jogos como o do “aviãozinho” e do “tigrinho” não serão regulamentados, já que não se enquadram em apostas de quota fixa — quando sabe-se qual valor do prêmio em caso de vitória na aposta.

No jogo do “aviãozinho” não existia um prêmio pré-determinado. O valor da premiação aumentava de acordo com a altura do voo do avião. Cabia ao apostador decidir que hora parar e acessar seu lucro. Se antes disso, porém, surgisse a palavra crashed, a aposta estaria perdida.

Mais de cem empresas demonstraram interesse

Mais de 130 empresas já manifestaram interesse no mercado brasileiro, número acima das expectativas do Ministério da Fazenda. Elas terão prioridade na análise de documentações e liberação de atividades. Cerca de 298 sites já foram identificados em funcionamento no país, mas mais de um domínio pode pertencer a mesma empresa.

Do total de empresas interessadas no mercado de apostas do Brasil, 44 são sediados em paraísos fiscais e 64 brasileiras. A regulamentação do mercado de apostas irá favorecer o desembarque de grandes casas internacionais.

A lista traz companhias de grande porte, como a MGM Resorts, com sede em Las Vegas, nos Estados Unidos, e outras casas do Reino Unido, China, França, Portugal, além de uma grande quantidade de empresas sediadas em paraíso fiscal.

A Secretaria de Prêmios e Apostas ainda não foi oficialmente criada pela Fazenda, mas isso não impede que a autorização e cobrança de impostos das empresas se inicie após publicação da portaria. A ideia é de que a pasta tenha 38 cargos, menos do que os 56 antes solicitados pela Fazenda ao Ministério da Gestão. Três subsecretarias farão parte da pasta: de autorização, fiscalização e sanção.


Fonte: O GLOBO