Segundo Flávio Lara Resende, presidente da Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão , 'são contratos que foram feitos legalmente, não dá para desfazer'

A tramitação do projeto de lei que prevê a remuneração de conteúdos exibidos na internet vem sofrendo atrasos devido a impasses entre artistas e radiodifusores. O presidente da Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert), Flávio Lara Resende, defende que o setor não pode abrir mão de dois pontos: a manutenção dos contratos audiovisuais já vigentes e a permissão para que artistas fechem acordos individualmente com as empresas.

A prevalência dos contratos já firmados sobre a nova lei é o grande entrave no debate. Os artistas entendem que muitos contratos assinados no passado precisam ser revistos, uma vez que as obras têm “nova exploração econômica no ambiente digital”.

Em entrevista ao GLOBO, Lara Resende defende a importância da nova lei, mas destaca que o cumprimento dos contratos existentes é questão de segurança jurídica.

Desde a última reunião com artistas e líderes da Câmara, houve avanço?

Não avançou mais nada. Estamos tendo, há dois meses, várias conversas com o relator, deputado Elmar Nascimento (União-BA), e com artistas. Na semana passada, participamos de uma reunião com os artistas na casa do presidente (da Câmara) Arthur Lira (PP-AL), que foi das 10h às 17h. Pareceu que tínhamos chegado a um acordo.

O relator colocou o texto dele, que nós concordamos. Depois, no último instante, os artistas voltaram atrás. Já abrimos mão de uma série de coisas. Tem duas coisas de que não podemos abrir mão. Uma é a manutenção dos contratos existentes até a data do seu vencimento. A gente acha que isso dá segurança jurídica. Terminou o prazo, cumpriremos integralmente o projeto de lei.

Qual o segundo ponto?

É a gestão individual dos contratos. Os artistas pleiteiam, há bastante tempo, que os contratos sejam feitos por gestão coletiva. O modelo seria como um Ecad (Escritório Central de Arrecadação e Distribuição) do audiovisual. Tudo seria feito por ele.

Nós não nos importamos que tenha a gestão coletiva, mas tem que se garantir também a gestão individual. Esses são os dois pontos. E me pareceu que estavam sanados, mas, de repente, os artistas voltaram atrás.

Houve contraproposta?

Não, depois não conversamos, não se falou mais nisso. Não há nada previsto para esta semana também. Temos um diálogo extremamente educado. Somos interdependentes. Mas, olhando para o futuro, achamos que o projeto tem que dar liberdade ao artista, se ele quer fazer o contrato pela gestão coletiva ou individual.

O relator incluiu que os contratos vigentes ficariam fora da nova regra. E também dá tolerância de três anos para as emissoras se adaptarem.

Estamos dispostos a abrir mão dos três anos. Não é fundamental. Pedimos o prazo porque são muitos contratos, e é um trabalho enorme se adaptar à nova legislação. Os dois pontos fundamentais para a radiodifusão são a gestão individual e coletiva e a manutenção dos contratos vigentes.

Artistas afirmam que existem contratos longos, que demorariam a entrar na nova lei.

São muitos produtores e emissoras. Não sabemos exatamente quantos contratos e a validade. Mas a maioria tem entre três e cinco anos. Os que já têm previsão de veiculação na internet, toda vez que é veiculado, os artistas são pagos. Pode ser que haja alguma distorção de valor, mas são contratos que foram feitos legalmente, não dá para desfazer.

A gente sabe que a lei é importante e fundamental para os artistas. Mas não acredito que existam contratos com validade muito longa, o artista prefere contratos menores.

O senhor acha que dá para negociar um meio-termo?

Entendemos que é preciso manter os contratos, mas estamos abertos ao diálogo. O problema é que toda vez que a gente senta, e parece que chega a um acordo, depois muda. Na última negociação, no último minuto, os artistas disseram que não tinham mandato para fechar acordo e precisavam consultar as bases. Voltaram atrás, e retrocedeu muito.

Pretendem tentar nova reunião?

Acho que chegamos no limite. O relator conhece nossa posição. Mas não nos furtamos de ouvir propostas. Continuamos dispostos a dialogar. Não queremos lesar ninguém, mas a gente acha que o contrato feito precisa ser cumprido. Os contratos que não citam exibição pela internet, aí sim será feita nova pactuação. Mas os que já citam são mantidos.

O senhor tem ideia de qual será o impacto para o setor ao aumentar a remuneração de obras exibidas?

Não temos uma ideia muito certa. Cada empresa tem uma ideia diferente de contrato. Para a radiodifusão brasileira, haveria um prazo e os dois pontos de exceção. Para as demais plataformas internacionais, valeria imediatamente.

Com a lei aprovada, o que mudaria na rotina de negociação com os artistas?

Vai ficar mais claro e fácil tomar decisões e formatar contratos. E o projeto tem outros pontos importantes: a remuneração jornalística e a publicidade. As plataformas, muitas vezes, usam conteúdos jornalísticos sem remuneração e ainda vendem publicidade atrelada aos nossos conteúdos, de jornal, revista e televisão.

O senhor acha que ainda há resistência das plataformas para esse tipo de remuneração?

Muita. Hoje, Congresso, Executivo e Judiciário concordam que as plataformas internacionais precisam ser reguladas. Acho que elas não entenderam de forma clara. Queremos que elas tenham os mesmos direitos e deveres das brasileiras.


Fonte: O GLOBO