Agência Brasileira de Inteligência operou um sistema secreto de monitoramento de cidadãos durante os três primeiros anos do governo Bolsonaro

Durante os três primeiros anos do governo Bolsonaro, a Agência Brasileira de Inteligência (Abin) operou um sistema secreto de monitoramento da localização de cidadãos em todo o território nacional, segundo documentos obtidos pelo GLOBO e relatos de servidores. 

A ferramenta permitia, sem qualquer protocolo oficial, monitorar os passos de até 10 mil proprietários de celulares a cada 12 meses. Para isso, bastava digitar o número de um contato telefônico no programa e acompanhar num mapa a última localização conhecida do dono do aparelho.

Casos como esse, no entanto, não são tão inéditos assim. Interferências na Abin, Relembre outros casos de espionagem na política brasileira.

Alexandre Ramagem: relatório para clã Bolsonaro

Alexandre Ramagem (PL) esteve à frente da Abin durante o governo de Jair Bolsonaro (PL), quando o órgão operou o sistema secreto de monitoramento da localização de cidadãos. Enquanto diretor do órgão, em várias ocasiões, Ramagem foi acusado de usar a estrutura da agência para atender a interesses do ex-presidente.

Antes da denúncia desta terça-feira, Ramagem foi alvo de acusações por suspeita de favorecer os interesses do clã Bolsonaro. 

Em 2020, a revista Época revelou que a Abin teria produzido ao menos dois relatórios de orientação para o senador Flávio Bolsonaro e seus advogados no pedido de anulação da investigação do escândalo das rachadinhas. A autenticidade e procedência foram confirmadas pela defesa do senador.

No ano passado, O GLOBO mostrou que um agente disse à PF que recebeu missão extraoficial para levantar informações de negócios envolvendo Jair Renan, o filho mais novo do presidente. 

Flagrado numa operação, o agente admitiu em depoimento que recebeu a missão de levantar informações de um episódio relacionado ao "04", sob apuração de um inquérito da PF. Segundo o espião, o objetivo era prevenir "riscos à imagem" do chefe do Poder Executivo.

Pegasus

Em maio de 2021, uma reportagem do portal UOL mostrou que o filho do presidente Jair Bolsonaro e vereador carioca Carlos Bolsonaro (Republicanos) buscou intervir em um edital federal, de modo a promover a aquisição do serviço da Pegasus, um sistema de espionagem israelense produzido pelo NSO Group. 

A ação, segundo o site, gerou insatisfação em militares que integravam o Gabinete de Segurança Institucional e a Abin, que teriam sido deixados de fora das tratativas. Segundo o veículo, dias após a reportagem, a empresa israelense deixou a licitação.

Em julho daquele ano, uma investigação conduzida por 17 meios de comunicação ao redor do mundo (incluindo The Guardian, Washington Post e Le Monde), fez uma denúncia. Segundo a investigação, mais de 50 mil jornalistas, empresários, defensores de direitos humanos, líderes religiosos e até chefes de Estado de dezenas de países tornaram-se potenciais alvos de espionagem pela Pegasus. O Brasil não figurou na lista.

No entanto, apesar disso, e-mails vazados pela WikiLeaks expuseram que, em 2015, a Polícia Federal brasileira estava no topo do ranking dos maiores fregueses da Hacking Team, empresa italiana concorrente da Pegasus no mercado de invasão de celulares à distância.

Maletas antigrampo no Senado

Em uma ação em decorrência da operação Lava Jato, em outubro de 2016, a Polícia Federal prendeu o então diretor da Polícia do Senado, Pedro Ricardo Araújo, e três auxiliares dele acusados de atrapalhar a apuração do esquema de corrupção na Petrobras. 

Segundo a PF, varreduras contra grampos feitas pela Polícia Legislativa teriam beneficiado o ex-presidente da República José Sarney (PMDB), os senadores Fernando Collor (PTC-AL) e Gleisi Hoffmann (PT-PR) e o ex-senador Edson Lobão Filho (PMDB-MA). A PF apreendeu mais de dez maletas antigrampo.

Os policiais foram acusados de fazer o serviço de contraespionagem em casas e escritórios de Sarney, Collor, Gleisi e Lobão Filho com o objetivo de descobrir se os quatro políticos estavam sendo alvo de escutas ambientais ou telefônicas da Operação Lava Jato.

Três anos depois, em 2019, o Supremo Tribunal Federal (STF) manteve a validade de parte das provas obtidas na Operação Métis, determinando que as maletas usadas por policiais legislativos do Senado para varreduras antigrampo continuassem apreendidas. Na mesma ocasião, o STF autorizou que a Procuradoria-Geral da República analisasse as tais maletas.


Fonte: O GLOBO