O ex-ministro da Justiça Anderson Torres ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) vai depor nesta quinta-feira (16) como testemunha na ação que investiga a reunião do ex-presidente com embaixadores em que ele fez ataques ao sistema eleitoral, em julho do ano passado.

É o mais adiantado dos processos do TSE que podem levar Jair Bolsonaro à inelegibilidade. O próprio ex-presidente já admite que muito provavelmente vai ser declarado inelegível e impedido de disputar eleições.

“Existe essa possibilidade de inelegibilidade, sim. A questão de prisão, só se for uma arbitrariedade”, disse o ex-presidente, ao participar de evento com brasileiros nos Estados Unidos.

Só que a ação ainda não está concluída, e tanto ministros do TSE como os próprios advogados ligados ao processo consideram que o depoimento de Torres pode fazer a diferença no resultado das apurações.

No depoimento, ele será cobrado a dar explicações sobre a minuta golpista encontrada na sua casa durante uma operação da Polícia Federal. A minuta detalhava passo a passo como deveria ser decretado um certo "estado de defesa" no TSE, dando poderes ao ex-presidente Jair Bolsonaro para interferir na atuação da Corte – o que é flagrantemente inconstitucional.

A forma como o ex-ministro responder a pelo menos três perguntas-chave pode fazer toda a diferença sobre o destino político de Bolsonaro.

Segundo a equipe da coluna apurou com fontes que acompanham de perto o caso, Torres será cobrado a dizer quem entregou a cópia da minuta golpista para Anderson Torres; como o documento parou na casa do ex-ministro da Justiça; e qual foi o papel de Jair Bolsonaro na confecção do texto. O depoimento foi determinado pelo corregedor do TSE, ministro Benedito Gonçalves, “de ofício”, ou seja, sem ser provocado pelas partes.

Essas três questões também orientam a investigação da PF sobre o caso.

Esta é a ação mais avançada dentre as 16 que investigam a campanha de Bolsonaro à reeleição. Nela, o ex-presidente é investigado por abuso de poder político e uso indevido dos meios de comunicação. Para integrantes do TSE, a inclusão da minuta golpista deu um novo fôlego ao caso.

Nomeado para a Secretaria de Segurança Pública do DF, Anderson Torres foi preso por decisão do STF após os atentados terroristas que culminaram com a invasão e depredação da sede dos três poderes. Ele está detido num batalhão da Polícia Militar no Guará, região administrativa da capital federal, de onde prestará depoimento ao TSE, por videoconferência.

Na última sexta-feira (10), uma decisão do ministro Alexandre de Moraes assegurou ao ex-ministro da Justiça o direito ao silêncio e a garantia de não se incriminar, caso seja confrontado com perguntas que possam “resultar em seu prejuízo”.

Por isso, fontes familiarizadas com o processo duvidam da real disposição de Anderson Torres de falar sobre o episódio em uma investigação altamente comprometedora para o antigo chefe dele.

Procurado pela equipe da coluna, o advogado de Torres, Rodrigo Roca, informou que ele vai responder aos questionamentos feitos durante o depoimento e não pretende ficar em silêncio.

Roca foi secretário nacional de defesa do consumidor do Ministério da Justiça durante a gestão de Torres e atuou como advogado do senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) no caso das rachadinhas, conseguindo implodir a investigação após anular relatórios do Coaf no Superior Tribunal de Justiça (STJ).

Em janeiro, a defesa de Bolsonaro alegou ao TSE que a minuta golpista encontrada na casa do ex-ministro é “apócrifa”, nunca foi publicada e “nunca extravasou o plano da cogitação”.

Os advogados também pediram que a Corte desconsiderasse a minuta golpista na análise da ação, mas não conseguiram.

O plenário do TSE acabou confirmando por unanimidade a inclusão da minuta na ação que trata sobre a reunião dos embaixadores, por considerar que os fatos estão relacionados e podem ser analisados conjuntamente pelo tribunal.

“Embora seja de rigor afirmar que a diplomação encerra o processo eleitoral, um clima de articulação golpista ainda ronda as eleições 2022”, apontou Benedito Gonçalves no mês passado.

Até aqui, Gonçalves tem dado ritmo célere aos casos, inclusive já submetendo aos colegas questões preliminares que poderiam levar à anulação dos processos mais à frente. O objetivo é reduzir o espaço de manobra se Bolsonaro quiser apontar alguma questão processual para implodir as investigações.

Em novembro, as ações sairão das mãos de Benedito Gonçalves e irão para Raul Araújo, ministro que tem tomado decisões mais próximas do que desejam os bolsonaristas. Por isso é que o PT quer que os casos sejam julgados ainda neste semestre, ou no mais tardar antes de Gonçalves deixar o tribunal, conforme informou a coluna.


Fonte: O GLOBO